MEMÓRIAS PAROQUIAIS DE LOUREIRO CONCELHO DO PESO DA RÉGUA EM 1758 Mas como são e como nasceram estas “memórias paroquiais”, perguntarão alguns menos versados nestas coisas do passado? Tudo terá começado quando em 5 de Janeiro de 1721 os responsáveis pela recém criada Academia Real de História dirigiram a todas as autoridades do Reino, assim como às Câmaras e aos Provedores das Comarcas, um minucioso questionário impresso, em que se solicitavam noticias de tudo o que às paróquias possuíssem com interesse, tendo em vista a elaboração de uma História Eclesiástica e Secular de Portugal e suas conquistas. Tal História não chegou a ser elaborada, mas houve, entretanto, um padre oratoriano (congregação do Oratório), Luís Cardoso de seu nome, que por sua própria iniciativa ou encarregado por alguém, com a colaboração de seu irmão padre António dos Reis e do oficial de tipografia Manuel Pereira, começou a compor a partir dos relatórios recebidos o conhecido “Diccionario Geographico, ou Noticia Histórica de todas as cidades, villas, lugares e aldeas, rios, ribeiras e serras dos Reynos de Portugal e Algarve, com todas as cousas raras que nelles se encontrão, assim antigas como modernas”. O primeiro volume, abrangendo os topónimos iniciados pela letra A, foi publicado em Lisboa em 1747, e a segunda, compreendendo as letras B e C veio a sair cinco anos depois. Porém, lamentavelmente, quase todo aquele extraordinário manancial de informações se viria a perder com o terramoto de 1755, salvando-se apenas os dois referidos tomos, por já estarem impressos e distribuídos à data do sinistro. Então a que padre, desejando compor novo dicionário, pediu e conseguiu, que o Marquês de Pombal (primeiro ministro do Rei D. José I), ordem para todos os párocos do Reino enviarem “novas descripções das suas freguesias”, com base num longo e não menos minucioso interrogatório, que foi distribuído através das dioceses. Redigidas em 1758-1759 e encaminhadas para a Secretaria de Estado, foram depois compiladas por ordem alfabética em 43 volumes, a que se acrescentou em 1832 um volume de índices, passando a constituir o impropriamente chamado “Diccionário Geográphico Portuguez”, que actualmente se encontra no Arquivo Nacional da Torre do Tombo em Lisboa. Sem sombra de dúvida que temos de considerar esta compilação de um valor extraordinário para o conhecimento da vida portuguesa dessa época, e sobretudo da vida rural, acerca da qual pouco se tinha escrito nos séculos anteriores. Quem se queira documentar sobre o evoluir da vida paroquial desses tempos, a demografia, a economia, a religiosidade de cada terra, tradições e outras particularidades históricas a cair no olvido, ou queira aprofundar estudos sobre a fauna e a flora, orografia e hidrografia, ou mesmo acompanhar a evolução linguística e ortográfica do nosso idioma, não pode prescindir da sua consulta. Pois como sublinhou oportunamente o professor Vitorino Magalhães Godinho, estamos perante “ a mais importante fonte de conjunto do país da História Portuguesa”. É verdade que encontramos descrições extremamente simples, mas há também outras tão minuciosas e prolixas, que a tudo respondem, mesmo quando nada tinham que responder. Só é pena que nos séculos anteriores ninguém se tenha interessado em mandar executar mais inquéritos deste género. A história regional e local, que entre nós tende a granjear cada vez mais cultores, estaria indubitavelmente engrandecida, como mais engrandecida ficaria também a História de Portugal. Segue-se então a transcrição das “Memórias Paroquiais de São Pedro de Loureiro”, não sem antes se indicar o teor dos interrogatórios enviados aos párocos. I O que se procura saber dessa terra é o seguinte: (venha tudo escrito em letra legível e sem breves). 1 – Em que província fica, a que bispado, comarca, termo e freguesia pertence? 1 – Esta freguesia de São Pedro de Loureiro fica na província de Trás-os-Montes, pertence ao bispado do Porto, no ecleziastico he comarca de Sobre Tâmega e no secular he comarca de Lamego, termo do concelho de Pennaguião. 2 – Se he de el-Rey, ou de donatário, e quem o he ao presente? 2 – He do excelentíssimo Marquês de Abrantes e todo o concelho, ao prezente he donatária a senhora Duqueza Camareira Mor. 3 – Quantos vezinhos tem, e pessoas? 3 – Tem duzentos e dois vizinhos, pessoas maiores seiscentas e vinte duas, menores sessenta e quatro. 4 – Se está situada em monte, ou valle, ou campina, e que povoações se descobrem della e quanto dista? 4 – Está situada em huma terra encostada que tem seu principio no ribeiro de Jugueiros e vai subindo athé chegar ao monte Mourinho, que he de particulares, monte razo que cria tojo, que dum anno entre outro se corta para cultura dos campos. Deste monte se descobrem para a parte norte, Vila Real, que dista três legoas e para poente a vila de Mezão Frio e a freguesia de Vila Marim e a de Cidadelhe, ambas em distancia de uma legoa, para o sul as freguesias de Penajoia, Samudens, Cambres, a de Figueira, do bispado de Lamego que distam uma legoa, para o nascente o Pezo da Regoa, em uma distancia de meia lagoa e a Poiares freguesia de Malta no arcebispado de Braga que dista uma legoa. 5 – Se tem termo seu, que lugares, ou aldeias comprehende, como se chamão, e quantos vezinhos tem? 5 – He pertencente ao conselho de Pennaguião. Tem lugares Loureiro, tem sessenta e huma vizinhos; Sobre Igreja, tem vizinhos vinte e seis; Outeiro tem sessenta e sette; Paradinha tem vizinhos sincoenta e sette; Marvão tem vizinhos sessenta e seis; Quintão tem vizinhos trinta e cinco; Paredes tem vizinhos sincoenta e seis; Coalhal tem vizinhos quarenta e três; Travaços tem vizinhos quarenta e sette; Azevide tem vizinhos outenta e cinco; Remezal tem vizinhos quarenta e seis; Torre tem vizinhos cem. 6 – Se a parochia está fora do lugar ou dentro delle, e quantos lugares ou aldeias tem a freguesia, todos pellos seus nomes? 6 – A igreja matriz está quazi no cimo do districto da fregueszia e sollitaria sem caza ou vezinhos ao pé, mais que a rezidencia do abbade. 7 – Qual he o seu orago, quantos altares tem, quantas naves tem e se tem irmandades, quantas e de que santos? 7 – Seu orago he São Pedro de Loureiro, tem cinco altares a saber, o maior, da parte do evangelho. Tem logo fora do arco da capella mor hum de Sam Sebastião e outro de Nossa Senhora e da outra parte em correspondência, tem hum do Menino Jesus e outro das almas, que a confraria que tem esta he sojeita ao Senhor Bispo com estatuto. E não tem outra alguma capela confraria. E tem mais entrando pella porta principal a direita huma capella que fica assima pia batismal separada do corpo da igreja da Invocação do Espírito Santo, que he do Morgado de Santa Comba com Missa quotidiana, que lhe impôs o instituidor e he seu actual admenistrador Domingos José Guedes Alcoforado, morador em Laurentim, freguesia de São Miguel de Lobrigos. Não tem naves a igreja, a referida confraria das almas não consta ao certo de sua instituição e informando-me achei que haverá sessenta para setentta annos. 8 – Se o parocho he cura, vigário, reitor, prior ou abbade, e de que apresentaçam he e que renda tem? 8 – Os párocos desta freguesia são abbades aprezentados pellos senhores da Caza de Murça e tem de rendimento hum anno por outro três mil cruzados, não fallando em despezas que são obrigados a fazer. 13 – Se tem algumas ermidas, e de que santos, se estão fora ou dentro do lugar, e a quem pertencem? 13 – Tem no cimo da freguezia huma ermida de São Gonçallo no sobre ditto monte Mourinho, que he da freguezia; fora do povoado há tãobem outra capella no sitio chamado Portella que pertence a José Manoel Guedes desta freguezia e fica fora do povoado, por cuja rezão tem sido roubada varias vezes; há também outra de Santa Izabel não longe desta igreja, que he de hum Manuel Pinto de Carvalho, mais outra, onde chamam a Granja de Nossa Senhora da Conceição e desviada de cazas que pertence aos filhos de André Borges de São Martinho de Mouros, moradores no bispado de Lamego; mais outra capella no lugar de Azervide, de Nossa Senhora da Assunção, que he de João Guedes de Figueiredo do mesmo lugar, com tribuna donde ouve missa e a sua família, que tem vincollo perpetuo com obrigação de três missas semanárias e a quinze de Agosto huma cantada; no mesmo lugar de Azervide há outra capella de Nossa Senhora de Boa Morte e São Jozé, que he de Henrique Xavier Guedes Mourão e nella tribuna donde ouve missa e sua família; há outra capella no sitio chamado do Valle, que he huma quinta separada com invocação de São Francisco e he de João Pacheco Pereira, Juiz da Alfandega da cidade do Porto; há tãobem no lugar de Paredes, de Nossa Senhora dos Martírios, que he de António Jozé Guedes Ozório, com tribuna de onde ouve missa e a famillia daquela caza. 14 – Se acodem a ellas romagens sempre, ou em alguns dias do anno, e quais são estes? 14 – À referida capella de São Gonçallo, vai bastante gente de romage no seu dia, assim da freguezia como de fora della e todas as terças feiras do anno havendo neste dia algumas missas e outras terças feiras não há missa alguma e se tem por millagrozo em todas estas vezinhas. A de Santo António tãobem no seu dia concorre muita gente desta e mais freguezias vezinhas. 15 – Quais são os frutos da terra que os moradores recolhem em maior abundância? 15 – Esta freguezia de todos os frutos dá, inda que em pouca quantidade e os que mais produz são vinhos. 16 – Se tem juiz ordinário, etc. câmara, ou se está sujeita ao governo de outras justiças de outra terra, e qual hé esta? 16 – Como fica ditto pertence ao conselho de Pennaguião, onde há dous juízes ordinários cada anno, dous vereadores e hum procurador. E há hum ouvidor nomeado pello donatário e he letrado, faz correição e conhece das appelaçoens e aggravos, que se interpõem dos dittos juízes deste conselho e do de Fontes e do de Godim, onde tãobem governa por serem estes conselhos do mesmo donatário e nos couttos do Pezo da Regoa e Mouramorta no que toca ao crime. E goza o ditto ouvidor de toda a jurisdição dos corregedores por especial mercê de Sua Magestade feita ao donatário, que foi e excellentissimo Marquês de Abrantes e he provedoria de Lamego. 17 – Se he couto, cabeça de concelho, honrra ou beetria? 17 – A cabeça deste conselho de Pennaguião he Santa Martha na freguezia de São Miguel de Lobrigos e mais fica respondido no antecedente. 20 – Se tem correio, e em que dias da semana chega e parte; e, se ou não tem, de que correio se serve, e quanto dista a terra donde ele chega? 20 – O correio que fica mais perto desta freguezia he do Pezo da Regoa, que dista meia legoa e he do que serve, o qual chega na terça feira pello jantar e parte na quarta pellas mesmas horas. 21 – Quanto dista da cidade capital do bispado, e quanto de Lisboa, capital do Reyno? 21 – Dista esta freguezia da capital do bispado, quatorze legoas e da de Lisboa, capital do reino, cincoenta e sette 26 – Se padeceu alguma ruína no terramoto de 1755, e em que, e se está reparada? 26 – Não houve ruína considerável no terreno (sic) por terremoto, de 1755 e só causou susto a gente. 27 – E tudo o mais, que houver digno de memoria, de que não faça menção o presente interrogatório. 27 – Nem acho nesta freguezia, couza digna de memória fora do que se pergunta, nem tãobem respondo ao mais de que faz menção o papel junto, por não haver aqui serras ou rios, sobre que inquire. . São Pedro de Loureiro, a 15 de Abril de 1758. Jorge Ferreira, abbade. /AN/TT – Memórias Paroquiais, Vol. 21 Mem 38, fls 1223-1227. NOTA: Loureiro em 1758 pertencia ao Concelho de Santa Marta de Penaguião, passando em 1898 para o Concelho de Peso da Régua.
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